Treinamentos: o papel do psicólogo no desenvolvimento de comportamentos nas organizações 19/08/2019 Psicologia e Análise do Comportamento Treinamentos: o papel do psicólogo no desenvolvimento de comportamentos nas organizações Compartilhar:

Autor: Yuri Lelis (CRP 08-26556)

O papel do psicólogo na função de planejar condições para desenvolvimento de comportamentos parece muito evidente em contextos clínicos. Porém, além da área clínica, outros contextos de atuação podem se beneficiar dessa prática (como em contextos organizacionais de instituições públicas como hospitais e secretarias) e privadas (como indústrias ou empresas de serviços).

Gusso e De Luca (2017) definem organização "como sistema de interações comportamentais orientado para a produção recorrente de resultados significativos para e na sociedade na qual ela se insere" (p. 33). Nesse contexto, é comum que os participantes desse sistema de interações comportamentais não tenham em seu repertório todos os comportamentos necessários para o bom andamento da produção desses resultados significativos. Partindo do princípio de que uma parte essencial dos comportamentos necessários em uma organização nem sempre são aprendidos no desenvolvimento familiar ou escolar, conclui-se a necessidade de que alguns comportamentos sejam treinados na própria organização.

É aí que entra a ajuda do psicólogo organizacional. A intervenção pode ser realizada com diversas finalidades, como na promoção da saúde física e mental do trabalhador, aprimoramento na segurança do ambiente de trabalho, melhorias no relacionamento entre os funcionários e entre funcionários e gestores, e medidas para evitar o desperdício e aumentar a produtividade. Em linhas gerais, pode-se resumir a intervenção em três etapas, sendo elas: 1) caracterização das necessidades e definição de comportamentos-objetivos; 2) planejamento e aplicação do treinamento; 3) avaliação do efeito do programa aplicado. Cada etapa é essencial para o bom andamento e eficácia da intervenção, e é recomendado que se gaste o tempo que for necessário no trabalho em cada uma delas.

1) Caracterização das necessidades e definição de comportamentos-objetivos

A intervenção se inicia com uma espécie de diagnóstico dos problemas apresentados pela organização. Assim como acontece no ambiente clínico, raramente os problemas serão apresentados de forma objetiva e operacionalizada logo no início. Considerando a importância de uma boa caracterização das necessidades da organização, o psicólogo pode se valer de diversas fontes de informação, como exemplos: observações no ambiente de trabalho, entrevistas com gestores e funcionários, análise das demandas trazidas por quem procurou o serviço, análise dos indicadores da organização, questionários anônimos, avaliações de desempenho.

A análise das informações levantadas deve permitir que o psicólogo caracterize quais são as necessidades da organização passíveis de serem resolvidas ou amenizadas por meio do treinamento, e também permitir descrever qual hierarquia dessas necessidades. Partindo das necessidades da organização, descreve-se quais são os comportamentos-objetivo a serem desenvolvidos mediante um treinamento. Os comportamentos-objetivos (Kubo & Botomé, 2001) recebem esse nome porque são descritos em termos comportamentais, ou seja, não se descreve apenas a classe de respostas a ser apresentada, mas também a relação dessa classe de respostas com os antecedentes e consequências ambientais das quais essa classe é função. Essa noção tem implicações importantespara o modelo de intervenção a ser utilizado. Definir os objetivos do treinamento em comportamentos-objetivo resulta em planejar quais as condições antecedentes que favoreçam o desenvolvimento da classe de respostas esperada e planejar quais as consequências que irão manter a ocorrência dessa classe.

2) Planejamento e aplicação do treinamento

A partir da descrição dos comportamentos-objetivos na etapa anterior, o próximo passo é planejar as etapas da atividade de treinamento relacionadas ao ensino desses comportamentos. O ponto de partida nesse planejamento são os comportamentos que os participantes já apresentam, o chamado repertório de entrada. O espaço entre o repertório de entrada e os comportamentos-objetivos é a área a ser considerada no planejamento do treinamento.

O planejamento é realizado com base nos princípios da aprendizagem descritos pela Análise do Comportamento. Nessa etapa, a descrição do procedimento de ensino oferecido pela PCDC (Programação de Condições para o Desenvolvimento de Comportamentos) pode ser utilizado na execução das atividades do treinamento.

Alguns pontos importantes a serem considerados são os recursos disponíveis para o treinamento, histórico anterior da instituição com contextos de ensino e treinamento e as questões de segurança relacionadas a aplicação da intervenção.

3) Avaliação do efeito do programa aplicado

Uma vez realizado o treinamento, o próximo passo é avaliar o efeito da intervenção em relação às necessidades levantadas na primeira etapa. Os critérios avaliados nessa etapa devem se basear nos comportamentos-objetivo do treinamento. A avaliação pode ser feita por meio de entrevistas, questionários e análise dos indicadores da instituição. Alguns pontos a serem avaliados são a satisfação dos participantes com o treinamento, as mudanças comportamentais produzidas, o impacto da intervenção nos processos da organização, e o retorno econômico e social sobre o investimento no treinamento. Com base nessas informações levantadas, é importante que se informe os resultados observados para o solicitante do serviço, fazendo um comparativo entre a situação da organização antes e depois da intervenção, como também descrevendo os pontos que não foram cobertos pelo treinamento e que necessitam de intervenções futuras.

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Referências

Gusso, H. L., & De Luca, G. G. (2017). Organizações como sistemas comportamentais: Considerações para a delimitação do campo de atuação. Vilas Boas, DLO, Cassas, F., Gusso, HL Comportamento em Foco: Análise do Comportamento nas Organizações. São Paulo: Associação Brasileira de Psicologia e Medicina Comportamental, 5.

Kubo, O. M., & Botomé, S. P. (2001). Ensino-aprendizagem: uma interação entre dois processos comportamentais.Interação em Psicologia, 5(1).